Andar de bicicleta
Já
me despertei, digo a vocês. Preparei o café, arrumei a mesa, deixei a Patroa
dormindo, para tudo se equilibrar. Nada de há, aqui e lá, que não deveria ser
como é. Pão-de-queijo no forno, broa de milho verde, meu Senhor, cuida disso depois
pra mim. Delicadezas do dia, vida que se anima, na rotina inédita que se
mostra. Roteiro que se anota, no diário crônico de agora, pois, assunto vem
para o prosear acontecer. Vem comigo que vai saber.
Arrumei-me
por fora de mim para sair. De casa de onde moro, esforço e não demoro, para uma
atividade física ser. Longe de ver, na escultura do corpo, o fitness espelhar.
É de chorar, e não rir, depois dos quarenta, caminhada não adianta tanto. Mas a
paisagem me mostra, na vagareza da hora, meu gosto tanto por apreciar gente. E
assim saio contente, sem preocupar, simplesmente, se meu metabolismo vai
ajudar. Ismos nunca ajudam. Isso é só danar. Mas andar de bicicleta vai.
Sim,
não leram errado. E, mesmo se tu fosses equivocado aqui, eu aí não faria
tamanha insensatez para não te perder. Claro, cê, ajuda ao vir aqui comigo
entender, esse mundo grande, pequeno para encontrar. Peguei minha bicicleta, a
magrela, o camelo do Renato, a bike que anda de duas rodas. Não é anedota, é
transporte da vida, a sustentar sua linha tênue de existir. Não chora minha amiga.
Ouço sua cantarolice há anos. Eu aprecio gente.
Andar de bicicleta é tão gostoso, mais que doce de leite e menos que abraço demorado. Se for de namorados, ah eu me desfaço. Mas o tema não é este, bobeia a astúcia da colega de rios ler, de novo o novelo que se estenderá na crônica a revelar, o quanto de caminhada de biciclo irei fazer. Aqui das Minas Gerais, Galo que canta mais alto, sê bobo não, a gente metafora tudo para esclarecer. Mordida no pão, manteiga nos lábios do paladar, saudade que se conta devagar, vida que se ensina com prazer. Ria um pouco e decante essa água salgada. Oceano para depois. Eis o assunto, pois.
A
vida é uma linha curva. A curva nunca se alinha, mais que desanima, quando nas
suas fronteiras batemos de frente. É um crash constante, numa velocidade
agonizante, que dá vontade de parar o tempo. Hoje amigos, amanhã namorados,
depois casados, dia após o outro. Dente que cai, trôpego que vai, joelho ralado
marcado na infância. Música no baile, geração Z que não sabe, como era bom
ouvir Roxette ao rosto colado. Ah... como eu insisto no romantismo... Dancem
juntas a mim, palavras, minhas namoradas, que se divertem comigo na solidão do
escrever. Crash, boom, bang!
Mas
mineiro é insistente, e ela vai entender a gente, ao ler tudo isso e respirar.
Ela, a vida, essa amiga, que ensina como andar de bicicleta. Paciente no
início, dá as rodinhas no suplício, de se esforçar na pedalada para não cair. Longe
começamos a ir, sem mais o empurrão dos pais, e da vida, quando as rodinhas
somem. Duas rodas agora, um caminho, um suspirar sozinho sem olhar para trás.
Segura os olhos, mire no horizonte, e siga destinos, andando no equilíbrio que
força a queda a todo instante. Não podemos ser vacilantes. Senão, crash, boom,
bang!
E
onde está a moral da história, Mineiro de pão-de-queijo? Ora, pense comigo, no
calor do amigo, se o transporte de duas rodas era para sempre estar no chão.
Como aquilo anda, se estabiliza, e não se desmancha, a ir velozmente no itinerário
que conduzimos? Como nossas mãos, fortes no guidão, segura as forças da mecânica
do transporte que nos leva? Como uma pedalada, uma após a outra, como um dia
após o outro, consegue te deixar exatamente onde queria? Como as rodinhas, tão
pequeninas, foram fortes para lhe ajudar a ficar de pé? Sente o vento no rosto,
o sabor do gosto, de vencer a travessia? Sim, fim da estrada, caminhada que se
faça, de caminhar no fino equilíbrio da vida e da bicicleta. Deus é foda! E
Mineiro nem te falo...
Volto
para casa, Patroa desperta animada, tomando café e vendo o menino correndo.
Eu todo suado, depois de ter ficado, na mistura de águas que a vida traz a cada
pensamento de pensar. Sento-me à mesa, divirto sem beira, rindo deles, da existência
e da sofrência de ter um pouco mais de quarenta, metabolizando carboidratos e reflexões.
Olho para o horizonte, sento no destino, volto para o ninho e acordo voando. A
bicicleta me trouxe até aqui. Quem me levou?
Vejo
o quanto pedalei, quilômetros de por quês, e nenhuma resposta do além mais explícita
veio. Deus em seu silêncio eloquente. Nessas reflexões, o menino corre e dá uns
puxões, ao controle remoto da TV, ao que tecla sem querer, o cancelar do anúncio
do YouTube. Geração Z agora vai entender, e todas as outras hão de ter, o entendimento
do coração, alma que fala. Milagre que se faça!
Como
em um Salmo que se visa, na modernidade que se televisa, o vídeo a se passar
seguinte, mostra a promessa cumprida: um ciclista olímpico conseguiu o índice.
Bicicleta nas mãos, suor no rosto e na paixão, vinte e três anos o atleta tinha
ao conseguir vencer seus obstáculos. Recorde olímpico, algo que fez sozinho, percorrendo
vales de trevas e mortes, pelos desfiladeiros do percurso, ao perigo que disse
não temer. Ouvi direito, aproximei do feito e vi longe algo perto de mim. Ele
falou comigo. Escutei Domingo...
No
Olímpico ou nos Jardins, no café da manhã ou nos pensamentos, em qualquer
lugar, onde eu estava, ali Ele também sim, pegadas que marcaram minhas
passadas. Minhas pedaladas. E desse jeito pude entender, nas Minas Gerais
dentro de meu ser, que a fé era a substância dentro de minha Igreja, o corpo
que andava, sentia medo, e não vacilava. O Corpo que despertou e não desanimou,
durante todo o percurso, nas sombras e na morte. O Corpo que fez tudo isso
acontecer. O Corpo que andou sob duas pernas, sob dois braços, sob uma direção.
O Corpo que não caía, o Atleta que fazia, batalhas ser emoção. O Corpo que é a
mecânica, de uma engenhosa arquitetura, que nos leva onde queremos ir. O Corpo
como a bicicleta. O Corpo que é a bicicleta, constato isso então. E a direção,
quem está no guidão, pergunto sem fim para a minha razão. Tem que haver uma explicação!
Na
direção, coração que não aguenta não, Ele leva o guidão para onde tuas preces pediu. Respostas da oração que se viu e ouviu, pois o que se cumpriu é na retidão a mensagem que diz...
Eu, ao fim, era a bicicleta... e Deus, em toda a ocasião, era quem pedalava então...
A Música tema desta Crônica é Crash! Boom! Bang! - Roxette.
Muito bom! Parabéns vc não perde momentos!
ResponderExcluirAdorei a crônica!!! E Roxette, sou fã!🥰
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